Uma igreja pisoteada pelos homens
Agora as palavras de Jesus não são de consolo. Não naquela altura do Sermão da Montanha. Após uma longa explanação dos princípios do reino, ele se dirige aos interlocutores, severo e incisivo: “Vós sois o sal da terra; e se o sal for insípido, com que se há de salgar? Para nada mais presta senão para se lançar fora, e ser pisado pelos homens.(Mateus 5:13)”. A ênfase havia mudado.
Mas, espere! Sal? Como assim? Tempero quase onipresente, tanto quanto imperceptível na mistura à qual for lançado, o sal se entretece em quase todos os pratos do mundo. Ninguém nota a diferença que faz, a não ser pelo… sabor! Ou seja, somente pelo efeito o sal se torna indispensável. Jesus estava advertindo que pesavam agora sobre os discípulos não apenas os privilégios, mas as responsabilidades. Ser notado sem abrir mão da essência, sem perder o sabor.
Dois mil anos se passaram e ainda as palavras ecoam para nós. Somos sal? Somos luz? Poderíamos olhar para Jesus e dizer: “Cumprimos o que nos pediste?”. Neste tempo em que a Igreja serve a tantos e variados propósitos a resposta é dúbia. Por um lado temos expoentes e anônimos que não se dobram à Baal, às ofertas fáceis, à política eclesiástica, aos sistemas religiosos que infectam as denominações, às heresias, ao fanatismo e tantas outras coisas que dessalgam a Igreja. Por outro, as mais incríveis e inconfessáveis negociatas em nome da Noiva do Cordeiro, com a anuência da liderança. Sim, a liderança que deveria guiar a congregação aos pastos da Palavra, guia-a agora aos banquetes mundanos.
O maior de todos os desafios da Igreja, portanto, não é crescer, mas brilhar! Não é construir grandes templos, mas ter sabor para os famintos de Deus e de sua Palavra. Não é se acomodar ao status quo, aquela zona confortável, quase sem confrontos, mas incomodar por aquilo que é. Do contrário, teremos uma igreja pisada pelos homens!
Uma igreja que é sal e luz não é refúgio de pecadores. O pecado deles viria à tona. Uma igreja que é sal não lava reputações, pelo contrário, expõe os malefícios para que sejam tratados. Não se deixa ridicularizar em rodinhas de piadas políticas ou no high society politicamente correto, mas escolhe a porta estreita todos os dias. Se impõe como bastião da ética e da moralidade.
Uma igreja que não quer ser pisada por homens não se aproxima de práticas que a deixariam vulnerável ou refém de proposituras individualistas e mercantilistas, quando não malignas. Uma igreja que não é sal é tão somente uma cópia falsificada da verdadeira Igreja que não se embaraça com os homens, afim de agradar Àquele que a chamou das trevas para sua maravilhosa luz!
Uma igreja que salga é dinâmica, atuante e perceptível. Não por seu tamanho, mas por sua eficácia. Não pelos acordos de gaveta ou pelo sibilar dos lábios maldosos, mas pela exposição da Palavra doa a quem doer. Passa das meras palavras, para a prática cotidiana. Foge dos modismos e das inovações que a distanciam de Deus. Não perde seu tempo com conversas e reuniões que não convém, mas faz o trabalho e a obra de Deus com afinco e ética.
Por abandonar os propósitos de Deus, Jerusalém está sendo pisoteada pelos gentios (Lucas 21:24). Se Deus largou a cidade amada à mercê dos opressores, o que não fará com uma igreja que não quer fazer sua vontade?
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