Gálatas: Restaurando os valores cristãos
Estamos compartilhando o esboço utilizado nos estudos que ministramos em duas congregações. É um tema difícil, especialmente num tempo em que se busca espiritualizar muitas coisas e muito as coisas. Creio que pudemos trazer informações relevantes dentro de nossas limitações.
Tema: Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a pela fé do Filho de Deus, o qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim (Gálatas 2:20)
Introdução
A carta de Paulo aos Gálatas tem como temática a graça do Evangelho em oposição aos ditames da Lei. Foi escrita num tempo de muitos ataques do chamado legalismo judeu, ora manifestado como uma adequação à religião judaica, ora em oposição à mensagem de Cristo. Se Paulo não contendesse com tal movimento, talvez o Cristianismo se tornasse apenas mais uma seita judaica.
Onde ficava a Galácia?
A Galácia ficava numa região sob domínio romano na Ásia Menor, onde hoje é a Turquia. Conforme podemos ver na rota de suas viagens missionárias é uma igreja que nunca foi visitada por Paulo, embora estivesse sob seus cuidados ministeriais. Talvez esse argumento fosse utilizado contra ele. Outra especulação é que como Paulo não fora do grupo original dos doze, as pessoas não deveriam prestar atenção ao que ensinava. De fato, o apóstolo após entregar-se a Cristo, ausentou-se de Jerusalém por 17 anos (Gálatas 1:17,18, 2:1). Na primeira visita não viu senão a Tiago, irmão de Jesus, que não era apóstolo, nem líder, e a Pedro. Mas ele havia recebido o apostolado do próprio Senhor Jesus (I Coríntios 11:23; Gálatas 1:15,16)! A epístola foi escrita por volta do ano 50 d.C., somente 15 ou 20 anos depois da morte e ressurreição de Cristo.
Qual o problema básico com a Igreja dos gálatas?
Sabemos que o Evangelho nunca teve vida fácil, sempre foi acossado por todos os lados. Aliás, é uma premissa de Jesus sermos odiados e perseguidos por seu Nome (Mateus 10:22), o contrário é que nos deve surpreender. O próprio Paulo foi perseguido a ponto de falar de perigo oito vezes num só versículo (II Coríntios 11:26). Porém, seu maior desafio não foi o imperador Nero, sob as ordens de quem foi decapitado, como ensina a tradição. Seu maior problema eram seus próprios patrícios!
Uma parte deles não queria ouvir falar de Jesus, pois acreditavam que o Messias não se encaixava nas suas características. Outra parte, crescente fora dos domínios de Jerusalém, abraçava ao Cristianismo, porém, queria continuar com todos os costumes judaicos. Não compreendendo que não se tratava de uma nova religião. Esses costumavam dar muito trabalho pois:
1) Eram segregacionistas. Acreditavam que o povo judeu era único, escolhido e incomparável;
2) Eram exclusivistas. Não admitiam que os gentios se convertessem. O próprio Pedro temeu um linchamento moral frente à companhia dos gentios na Igreja (Gálatas 2:11,12). Deus compeliu o apóstolo a quebrar o paradigma no episódio de Cornélio, em Atos 10, mas uma parte de seu ser parece não ter aprendido a lição;
3) Causavam dissensão a respeito dos costumes judaicos. Quando alguém se convertia e não era judeu era tratado como cidadão de segunda classe. Se era homem obrigavam-no a circuncidar-se.
Portanto, além de toda a perseguição dos gentios e poderosos, que viam o crescimento da Igreja como uma ameaça ao próprio Império Romano, havia essa pressão interna. A Igreja já havia realizado seu primeiro Concílio (Atos 15), provocado por Paulo, que discutiu com Barnabé sobre este assunto, do qual partiu a seguinte admoestação aos gentios: “Na verdade pareceu bem ao Espírito Santo e a nós, não vos impor mais encargo algum, senão estas coisas necessárias: Que vos abstenhais das coisas sacrificadas aos ídolos, e do sangue, e da carne sufocada, e da fornicação, das quais coisas bem fazeis se vos guardardes. Bem vos vá” (Atos 15:24-29). Mas os focos de tensão permaneciam…
E o que Paulo fez?
Entre outras providências, o apóstolo dos gentios escreveu a monumental carta aos Gálatas, que tem 6 capítulos e 149 versículos. Nela Paulo não desmerece a Lei, mas a coloca em seu devido lugar. Ela foi escrita para um tempo oportuno a Israel, até que viesse o Messias e fizesse seu cumprimento de modo perfeito e eficaz (Gálatas 4:5,6). Ou seja, nenhum crente da dispensação da Graça está sujeito às normas da Lei!
Indo adiante…
Longe de ser apenas uma carta apologética, a epístola aos Gálatas resgata a essência do Evangelho. O que emana de suas linhas é a mais perfeita definição da obra redentora de Cristo, realizada a partir do seu sacrifício. Nosso tema busca restaurar tais paradigmas, quais sejam:
1) O Evangelho e a Lei não se opõem, se complementam (Gálatas 3:15). Não precisamos cumpri-la, porque Cristo já fez isto por nós! A Lei é sobre o que fazemos por sermos judeus, a Graça é sobre o que Cristo fez por nós para sermos salvos! Devemos levar em consideração que nem havia Lei quando Deus chamou e justificou a Abraão. A Lei era um aio (um servo chamado para ajudar nas tarefas dos filhos de famílias abastadas), não era pai, nem professor (Gálatas 3:24; 4:1-3). Era um marco para as pessoas saberem até onde podiam ir;
2) Ao Evangelho, cujas linhas mestras, estão contidas no Novo Testamento, não é necessário acrescentar nada, sob pena de ser considerado anátema (Gálatas 1:8,9). O concílio recomendou três coisas básicas aos gentios: abster-se da idolatria, da carne sufocada e da fornicação. Claro que outros pecados estão descritos ao longo do Novo Testamento, mas nenhum daqueles prescritos na Lei. Embora os costumes sejam característicos das denominações, pois todas os tem, não podem substituir o sacrifício de Cristo na cruz: “Portanto, ninguém vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa dos dias de festa, ou da lua nova, ou dos sábados, que são sombras das coisas futuras, mas o corpo é de Cristo.” (Colossenses 2:16,17);
3) O novo homem nem é judeu, nem gentio, mas o salvo! Para os primeiros a descendência e o cumprimento da Lei era a condição para a salvação, para o segundo grupo a vida em ignorância atenuaria a condenação. O novo homem é kainós, novo de uma nova espécie, em relação à qualidade, ao contrário de néos, que é novo segundo o tempo, como uma linha de produção de bebidas. Deus, pois, criou o salvo, nem judeu, nem gentio! Este novo homem é distinto, exclusivamente, pela presença do Espírito Santo (João 14:23; Efésios 2:18,20-22; Gálatas 4:6), todas as outras categorias perderam o efeito (Gálatas 3:28);
4) Ao invés da liberdade do Evangelho não podemos dar lugar à libertinagem. Paulo fala claramente sobre isso: “Porque as obras da carne são manifestas, as quais são: adultério, fornicação, impureza, lascívia, idolatria, feitiçaria, inimizades, porfias, emulações, iras, pelejas, dissensões, heresias, invejas, homicídios, bebedices, glutonarias, e coisas semelhantes a estas, acerca das quais vos declaro, como já antes vos disse, que os que cometem tais coisas não herdarão o reino de Deus” (Gálatas 5:19-21);
5) Esta novidade de vida, provida pela graça, não abre mão do fruto do Espírito, que é aquilo que está dentro de nós e brota de um coração convertido: “Mas o fruto do Espírito é: amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança” (Gálatas 5:22);
6) Devemos crucificar o velho homem com as suas paixões, buscando agradar a Deus. O que isso significa exatamente?
a. Devemos reconhecer que nossa natureza não está completamente amortecida, sempre nos pregará peças, buscando nos desviar dos caminhos do Senhor. Ou seja, há um velho homem tentando dominar o novo, nós decidimos qual deles vai prevalecer;
b. Não podemos culpar exclusivamente o Diabo, ao pecar. Isso tem um nome, chama-se transferência de responsabilidades e foi tentado por todos os seres humanos desde Adão. Faz parte do processo do perdão assumir nossa responsabilidade;
c. A vida cristã é uma constante renúncia. Quem não é capaz de abrir mão de si mesmo, não pode herdar o reino de Deus. O padrão bíblico não é apenas “E quem não toma a sua cruz, e não segue após mim, não é digno de mim”, mas “Quem ama o pai ou a mãe mais do que a mim não é digno de mim; e quem ama o filho ou a filha mais do que a mim não é digno de mim” (Mateus 10:37, 38);
d. Ouçamos Barclay: “E assim a religião já não é questão de satisfazer as exigências da Lei, mas sim de enfrentar-se com as obrigações do amor. O homem pode satisfazer as exigências da Lei porque esta tem limites legais e estatutários; mas jamais poderá satisfazer as exigências do amor porque, se fosse capaz de entregar à pessoa amada o Sol, a Lua e as estrelas, ficaria, entretanto, com a sensação de que sua entrega era muito pequena”.
7) Ao contrário de muitos intérpretes é na carne que se manifesta aquilo que somos no Espírito. O cristão não é alguém que aprendeu a teoria, mas a prática cotidiana é diferenciada. A ortodoxia (correta doutrina) não prescinde da ortopraxia (a prática correta), porque devemos ser espirituais em todas as esferas da vida e agradar a Deus, como se estivéssemos vivendo sua própria vida.
O resgate dos valores cristãos não deve ser apenas brandido em metas e dísticos de igrejas, mas na prática de seus membros. Temos uma Nação carente de prática. Não duvidemos, boa parte daquilo que sofremos como povo é um eco do que somos como Igreja. Ou seja, prática, prática, prática!
Infelizmente nossa Igreja passou anos valorizando o vaso em detrimento de seu conteúdo. O resultado é que tivemos crentes conformados a determinado modelo denominacional enquanto estavam alheios a muitos dos grandes problemas. Não podemos ignorar o valor dos usos e costumes, a questão é colocá-los no lugar da salvação. Outros buscam judaizar a Igreja hoje em dia através de símbolos e rituais judaicos. É uma prática reprovável.
Esqueçamos a Lei e cresçamos na Graça!
Bibliografia
Barclay, William, Gálatas, CLIE
Keller, Timothy, Galatians for you, The Good Book Company
Bíblia NTLH
Bela exposição. Guardarei no coração.
Paulo tomou conhecimento de que certos mestres judaicos estavam inquietando seus novos convertidos da Galácia, impondo-lhes o jugo da lei mosaica como requisitos á salvação e ao ingresso na igreja. Gostei muito como o senhor, Pastor Daladier, escreveu o trecho: O Evangelho e a Lei não se opõem, se complementam. A lei nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo. Boas palavras, guardarei este este estudo, muito obrigado!!
Que assunto interessante,Deus te ajudem meu Pastor.