Leiamos Barclay:
O nome de Nicolau, fundador dos nicolaítas, provém de duas palavras gregas, nikan, que significa conquistar e laos, que significa povo. Balaão, por seu lado, pode derivar-se de duas palavras hebraicas, mofa, que significa conquistar, e ha’am, que significa povo. Os dois nomes, então, têm o mesmo significado e, provavelmente se trate da mesma pessoa, um mestre daninho mas influente, que conseguiu subjugar a muitos seguidores e ganho uma vitória para o mal.
Qual é a história de Balaão do Antigo Testamento? Em Números 25:1-5 encontramos uma história muito estranha sobre como os israelitas foram seduzidos a manterem relações ilícitas e sacrílegas com mulheres moabitas e a adorarem a divindade pagã Baal-Peor, uma sedução que, senão fosse controlada com severidade, teria arruinado toda a religião de Israel e a teria destruído como nação. Quando seguimos lendo e chegamos a Números 31:16 encontramos que esta separação se atribui totalmente à influência maléfica de Balaão. Balaão, portanto, figura na história do povo hebreu como uma pessoa perversa que arrastou o povo de Deus à imoralidade e ao pecado.
Vejamos agora o que dizem os historiadores da Igreja com relação aos nicolaítas. A maioria os identifica como seguidores de Nicolau, um prosélito de Antioquia que aparece em Atos (6:5) como um dos sete comumente chamados diáconos. A ideia é que Nicolau se perverteu e chegou a ser o dirigente de uma heresia. Irineu diz com relação aos nicolaítas que “viviam vidas de irreprimida indulgência” (Contra Hereges, 1.26.3). Hipólito diz que Nicolau era um dos sete, e que se apartou da doutrina correta, “inculcando a indiferença em matéria de alimentos e hábitos de vida” (Refutações de Heresias, 7.24). As Constituições Apostólicas descrevem a Nicolau como “desavergonhado em sua impureza”. Clemente de Alexandria diz que “os nicolaítas se abandonam ao prazer como bodes… levando uma vida de indulgência irreprimida”. Mas livra a Nicolau de toda culpa, dizendo que os nicolaítas corromperam o ensino daquele, para quem “a carne devia ser abusada”. Com estas palavras Nicolau queria dizer que o corpo deve ser castigado; os hereges perverteram este ensino ao afirmar que a carne pode usar-se tão vergonhosamente como a pessoa imaginar (Miscelâneas, 2.20). Os nicolaítas, então, ensinavam a imoralidade e a vida leviana. Procuraremos descrever de maneira mais detalhada o ponto de vista e os ensinos destes hereges. A carta a Pérgamo diz que os nicolaítas faziam com que os crentes comessem carne que tinha sido oferecida aos ídolos e fornicassem. Nos decretos do Concílio de Jerusalém (Atos 15:28-29) estabeleceu-se que os gentios seriam admitidos na Igreja só se estivessem dispostos a aceitar duas normas de vida: Abster-se de comer carne que tivesse sido sacrificada aos ídolos e não fornicar. São estas as duas condições que os nicolaítas quebrantavam.
É muito provável que os nicolaítas oferecessem a seguinte argumentação a favor de sua doutrina herética:
– A Lei perdeu vigência, portanto já não há regras, mandamentos ou normas que devam obedecer-se. Temos o direito de agir como bem quisermos. Confundiam a liberdade cristã com a libertinagem, que tão longe está de nossa verdadeira fé. Eram aqueles a quem Paulo aconselhou a não usarem sua liberdade como ocasião para a carne (Gálatas 5:13).
– É provável que cressem na corrupção radical do corpo, afirmando que só o espírito era bom. Portanto a pessoa podia fazer o que queria com o corpo, porque este já não contava e era impossível redimi-lo. Se o corpo carecia de importância, não importava tampouco se o cristão saciava até a indigestão seus apetites.
– Provavelmente sustentavam que o cristão está a tal ponto sob a proteção da graça divina, que não tinha importância aonde fosse, o que fizesse ou com quem andasse. A graça o protegia e fizesse o que fizesse obteria sempre perdão de parte de Deus. Ressalta evidente que os nicolaítas eram tremendamente perigosos, porque pervertiam para seu próprio beneficio as verdades cristãs mais importantes. O que podemos perceber por trás da perversão da verdade que os nicolaítas pregavam? O problema era a diferença que necessariamente havia entre a sociedade pagã e a comunidade de cristãos primitivos. Os pagãos não tinham problemas em comer carne que tinha sido oferecida aos ídolos. Em geral o faziam em qualquer celebração festiva da que participassem. Poderia o cristão participar de tal festejo? Os pagãos, por outro lado, não tinham uma norma moral que exigisse que fossem castos.
As relações sexuais antes e fora do casamento eram normais para eles e não constituíam uma desonra. Deviam os cristãos ser tão diferentes? Deviam separar-se tanto das práticas e normas do mundo em que viviam? Era necessário que fossem tão diferentes? Os nicolaítas sugeriam que não havia razão alguma para que os crentes se diferenciassem dos demais em matéria de moral, visto que não havia razões de peso para que tivessem que “romper” com o mundo. William Ramsay descreve seus ensinos da seguinte maneira: “Era um intento de efetuar um compromisso razoável com a sociedade greco-romana, retendo tanto quanto possível de seus costumes no regime de vida dos cristãos.” Este ensino, como era de esperar-se, afetava sobretudo os cristãos cultos e influentes, membros das classes superiores, porque estes eram os que tinham mais a perder ao se entregarem sem reservas às exigências do Evangelho. Para João os nicolaítas eram piores que os pagãos, porque agiam como inimigos que conseguiram infiltrar-se nas filas da Igreja.
Os nicolaítas queriam estar de acordo com o mundo; não estavam preparados para ser diferentes; não estavam em condições de tomar a grande decisão; queriam desfrutar do melhor de ambos os mundos. De um ponto de vista prático eram os piores hereges que houve, porque se seu ensino tivesse tido êxito, o mundo teria mudado o cristianismo e não o contrário o cristianismo mudado o mundo.