Esse é um assunto urgente, pesado e longo. Antes da pandemia poucas igrejas se davam conta da importância das redes sociais. Assistimos grandes líderes dizer que eram um antro de fofocas, que não perderiam tempo com elas, etc. Parte do argumento era procedente, mas a zanga se referia à exposição de atitudes negativas dos tais líderes. Parte do problema é que havia agora um público disposto à contestação e eles estavam acostumados à comunicação de mão única, feita, quando não imposta, do púlpito. Assim é fácil!
Eis que chega a pandemia, que todo mundo pensou que acabaria em poucos dias, no máximo, dois ou três meses. Aniversariou em março e ninguém sabe quando termina. Milhares de irmãos sumiram dos cultos. Boa parte diminuiu o ritmo. As próprias celebrações se reduziram, muitos faleceram e a maioria dos pastores não sabe o que fazer para atrair novamente os irmãos. Não duvido que muitos nem pensaram a respeito.
A EBD se esfacelou e em poucos lugares voltou ao patamar de janeiro/2020. A evangelização evaporou com as restrições e o distanciamento. O Círculo de Oração e a maioria dos trabalhos semanais, idem. As lives se multiplicaram. Pequenas congregações adquiriram, com alguma dificuldade, equipamentos e softwares que permitem uma transmissão razoável. A qualidade da maioria é discutível, mas já debatemos esse assunto.
Conheço pessoas, famílias inteiras, que não vão à Igreja desde março de 2020. Nem tencionam ir. Outras que foram duas ou três vezes. É um desafio. Muitos estão machucados pela perda brutal de entes queridos. Alguns não conseguem entender a soberania de Deus. Muitos nem puderam revê-los pela última vez. Perdi um cunhado para esta doença terrível e nem pudemos nos aproximar do caixão. Fizemos uma cerimônia a dez metros do ataúde e vimos os coveiros levá-lo para enterrar à distância. Os caixões se enfileiravam atrás de nós e nos deram apenas alguns minutos para concluir o culto fúnebre.
Ficou escancarada a incompetência das grandes igrejas para assistir a seus membros na dor. Seja pela incapacidade de atender muitos féretros, seja pela centralização decisória, seja pela indolência institucional, pela falta de planejamento, pela habilidade de lidar com a dor alheia ou tudo isso junto e misturado. A realidade é que muitos membros sentiram.
Já nos debruçamos aqui sobre alguns dados colhidos em pesquisas deste blog nas quais se desnudava a realidade de muitos irmãos que não receberam sequer uma ligação de seus pastores. Muitos até este momento em que escrevo! Num tempo de comunicação abundante (whatsapp, e-mail, inbox, sms) é algo inadmissível. Em muitos casos beira o cinismo alguém dizer que é um pastor de uma ovelha que não vê há um ano!
Mas aos trancos e barrancos, com lives atrapalhadas e cheias de trapalhadas, fomos atravessando os meses. Há uma massa de membros e congregados a serem assistidos e eu acredito que os cultos não voltarão ao normal tão cedo. Mais uma vez as dificuldades campeiam. Como quase nenhuma igreja possui os dados atualizados dos membros a liderança fica à mercê de quem quiser ir. E quem não quiser ou não puder, como fica?
Os milhares de crentes que estão lidando com a dor da partida de um ente querido, administrando as dificuldades da falta de um provedor para o lar, convivendo com as sequelas de infecções pelo COVID, questionando-se a respeito da fé, onde encontrarão guarida? É urgente um ministério digital para tomar algumas providências e minorar as implicações da pandemia.
Primeiro, é preciso reestruturar os sites das igrejas. É por lá que muita comunicação pode se efetivar. A vantagem evidente do site é a facilidade com que podemos navegar em informações centralizadas e sempre atualizadas, linkadas para poder fazer algum nexo. Num perfil de Facebook fica mais difícil porque a linha do tempo é preenchida com informações desnecessárias de outros perfis que seguimos, propagandas e acabamos nos perdendo num emaranhado de coisas. Quando não perdemos a própria atenção. Procurando uma coisa, achamos outras mil que não nos interessavam há um minuto!
Já falamos aqui em como os sites eclesiásticos são em sua esmagadora maioria ruins. Informações desatualizadas, desencontradas, conteúdo sem qualidade, sem relevância. Faltam os horários dos cultos, os endereços das congregações, não se integram com as redes sociais, falta conteúdo pastoral de qualidade, etc. Precisamos suprir essa lacuna. Não basta ter um endereço virtual e pedir ofertas, é preciso retorno para a comunidade eclesiástica!
Pelo próprio site o membro pode atualizar seus dados, que serão validados numa etapa posterior. Pode interagir com um atendente via chat (esses atendentes podem estar em home office), enviar um e-mail com alguma necessidade, receber retorno desse e-mail, etc. É indispensável que a equipe alimente o site com informações relevantes, que preste efetiva assistência, com encaminhamento de eventuais dúvidas e reclamações. Que atualize horários de cultos e endereços das congregações, etc.
Segundo, é preciso uma equipe que administre as redes sociais. Que publique versículos, avisos, informações relevantes e coisas do gênero. A EBD esfacelou-se? Que tal a aula passar a ser transmitida ao vivo? Que tal uma sala de aula somente para os que não puderam vir? Só um ou dois professores transmitindo a aula como se os alunos presentes estivessem! Evidentemente, deve haver uma divulgação eficiente de como acessar a aula, com horários certos e transmissão adequada!
Terceiro, precisamos produzir conteúdo. O membro está ávido por conhecimento, mas vai no site de sua igreja e não tem nada!? Posso listar dezenas de nomes de amigos e amigas assembleianas que estão assistindo a canais teológicos relevantes de outras denominações porque, infelizmente, falta-nos tal iniciativa. Aliás, os canais desse tipo de conhecimento explodiram em audiência! Infelizmente, a não ser por casos excepcionais as igrejas não acompanharam o crescimento.
Certamente não podemos contar apenas com nerds espinhentos. Precisamos treinar equipes inteiras de pessoas crentes de verdade, amadurecidos, principalmente, lideranças, para replicar conhecimentos e postagens, conduzir grupos de estudos bíblicos on-line, conectar pessoas, dar apoio psicológico, entre outras coisas. Aliás, um dos maiores problemas à nossa espreita onde podemos atuar é justamente na área de apoio emocional. Grande quantidade pessoas está traumatizada pelos eventos que se sucederam desde o início da pandemia e precisam de ajuda séria e competente.
Quarto, é preciso gastar dinheiro com isso! Temos que encarar esses novos tempos como qualquer outro investimento da Igreja. Posso estar enganado, mas não é uma onda que passa. E se passa não acontecerá tão cedo. Além disso, a pandemia provocou rupturas profundas. Ou aproveitamos para fazer do limão uma limonada ou perderemos novamente a oportunidade.
Façamos algumas contas. Quanto gastávamos em eventos? Com cantores, pregadores, etc? Hospedagem, alimentação, logística? Até as construções de novos templos pararam um pouco. Todo esse montante está represado e parte dele pode ser investido nesse que denominamos, ministério digital. Não, necessariamente, implica em acabar com o mundo real, fechar as igrejas e fazer apenas cultos on-line. É que a realidade se impôs e é para lá que precisamos direcionar nossas energias. Devemos cuidar dos templos com o mesmo carinho do mundo virtual!
Notem como o cenário à nossa volta mudou e tão cedo voltará ao normal, se é que voltará. Precisamos agir para ontem de forma planejada e calculada antes que nada mais possa ser feito. O mundo como o conhecíamos mudou completamente e não há como voltar atrás. Milhões de alunos, por exemplo, estão no EaD (eu entre eles). As compras on-line explodiram. Somente em 2020 cresceram 41% e o movimento é ascendente. Centenas de procedimentos dos orgãos públicos são agora digitais! Tudo, enfim, mudou!
Ontem, fomos almoçar em determinado restaurante popular que estava sempre lotado. Em outros tempos já tivemos que esperar que uma mesa desocupasse. Ao contrário, não havia ninguém além de nós, só depois de uma meia hora é que chegaram pessoas para duas outras mesas. E só. Isso por volta das 12:30h de um domingo.
Mas, atenção, a cozinha estava frenética. Os entregadores não paravam. O que acontece? As pessoas estavam mais próximas umas das outras ou amedrontadas, preferindo ficar em casa e dali fazer seus pedidos. Se o restaurante, entre tantos outros, não abre os olhos para essa realidade, simplesmente, fecha!
Mal comparando, o que acontece com a Igreja hoje é como se fosse um restaurante e continuasse com suas instalações abertas, fechando o olhos para o delivery e esperando que os clientes chegassem presencialmente! Não dá mais pra fazer as coisas do mesmo jeito! E se o líder maior não tem conhecimento suficiente pra capitanear essa mudança, delegue a quem pode! Não há problema algum. Não se pode esperar que por ser líder saiba fazer tudo.
Oremos!
Ps: Perguntas que podemos fazer para avaliar a gravidade da questão:
- Não sou evangélico, existe um roteiro no site da Igreja para que eu saiba o que fazer para conhecer Jesus? Gostaria de tirar dúvidas genéricas sobre a Bíblia, isso é o possível no site da Igreja?
- No site da Igreja existe um roteiro para aprendizado bíblico básico? Gostaria de fazer um curso básico on-line para conhecer os rudimentos do Evangelho isso é possível no site da Igreja?
- Qual o endereço da Igreja, com mapa linkado em aplicativos como Waze e Google Maps? Aliás, qual o endereço com esses mesmos links das diversas congregações em volta do lugar onde resido?
- Qual a pessoa que devo procurar na igreja se quiser me decidir por Cristo? Como devo proceder? É possível receber uma visita em minha casa para me decidir por Cristo, onde encontro essa informação?
- No site da Igreja existe um roteiro de discipulado para mim que sou novo convertido? Há algo que eu possa fazer o download e ler?
- No site da igreja existe um formulário para que eu exponha meu problema, solicite ajuda ou agende uma visita?
- Como poderia contactar um pastor para receber ajuda espiritual?
- Como posso contactar alguém na Igreja para superar o luto? Existe algum material para leitura sistemática sobre esse assunto no site da Igreja?
- Há uma base de dados atualizada dos membros? Eles podem atualizar dados corriqueiros como endereço e telefone? Como é feita a validação dentro da equipe de TI?
- As interações são atendidas? Há uma equipe multidisciplinar preparada para oferecer uma resposta razoável a uma solicitação on-line?
- As métricas de acessos, interação e atividade são acompanhadas profissionalmente? Como anda a qualidade dessas métricas? Há um planejamento estratégico para elas? Quanto está sendo investido no seu crescimento?
- Todas as igrejas do ministério estão equipadas com os mesmos recursos da Igreja sede? Conexão de internet? Câmeras? Equipamentos de edição e transmissão? Profissionais treinados?
- Há um plano posto em prática para a efetividade de um Ministério Digital?