Por César Moisés*
As principais mudanças da primeira década do século 21 e suas implicações para a Igreja
A Igreja em um mundo novo
É fato que o tempo e o mundo em que vivemos são muito distintos dos originais em que a Igreja nasceu. Como viver os mesmos princípios doutrinários que marcaram os primeiros cristãos em situações tão diferentes? Esse desafio só pode ser vencido com o que Karl Barth dizia acerca de o cristão carregar em uma das mãos a Bíblia e, na outra, o jornal. Em termos diretos, não podemos comunicar a mensagem cristã como se estivéssemos falando às pessoas do “século passado”, precisamos fazer com que o Evangelho faça sentido às de hoje.
Popularidade do processo de globalização
Apesar de a “globalização” ser um processo antigo de tentativa de integralizar os países, a expressão globalização só começou ser popularizada no final do século passado e início deste. Ainda sem um consenso a respeito do assunto, tanto em termos de definição quanto de história, neste novo século, em 2004, foi que presenciamos a entrada de dez novos países à União Europeia, um dos chamados “blocos econômicos” mais conhecidos. A própria China, que sempre foi hostil e arredia, em 2002, passou a compor a OMC — Organização Mundial do Comércio. A globalização, na realidade, é ainda um reflexo principal de uma das principais características humanas, que é a necessidade de estar junto. Contudo, desde a Torre de Babel, tal “união” não significa solidariedade, mas altivez e orgulho em relação a Deus e uma forma de expropriar ainda mais o semelhante.
O terrorismo marca o início do novo século
O mundo assistiu atônito aos ataques terroristas em 11 de setembro de 2001. Quase três mil pessoas perderam a vida e o mundo despertou para o que se avizinhava no novo século e milênio: Nossas fortalezas verticais não podem conter o sentimento de ódio. Para mudar o mundo, é preciso antes transformar o homem.
A era da informação instantânea e o avanço tecnológico
O aumento do acesso à informação é algo que vem em ritmo crescente desde os últimos vinte anos. Contudo, foi mesmo nesta primeira década do século 21 que a internet deixou de ser algo apenas remoto e limitado aos aparelhos de “fax-modem” com acesso discado, para acesso irrestrito através das “redes sem fio” (Wi-Fi e Wireless). Já não é mais preciso estar em casa para acessar a grande rede e verificar o e-mail ou conferir as notícias. Agora é possível até mesmo assistir a um programa de televisão ou ver um vídeo. O maior reflexo desse crescimento são as modernas invenções tecnológicas deste novo século. Desde os modernos celulares cuja função telefone é, de longe, a mais importante, até vários outros avanços que revolucionaram a comunicação digital, todos inventados ao longo desta década e, principalmente, a partir de sua segunda metade, temos: Laptops cada vez menores e mais leves, porém, com mais capacidade de armazenamento de informações; Smartphone; Palmtop; Ipad; Ipod; Iphone; TV de plasma e de LCD; Televisão em 2, 3 e 4 Ds; MP 7; etc.
As epidemias globais
Primeiro foi a Sars (Severe Acute Respiratory Syndrome – Síndrome Respiratória Aguda Grave), depois veio a gripe aviária e, recentemente, a suína. Pestes que através de aeroportos, ou outros ambientes com grande concentração e rotatividade, acabaram globalizando epidemias e causando milhares de mortes neste novo século.
O avanço científico
No início deste novo século deu-se a conclusão do mapeamento do genoma humano. A biomédica e a bioética nunca foram tão populares quanto agora. Há pouco tempo, discussões envolvendo o assunto sobre células tronco foram acompanhadas por todo o país, quando o Supremo Tribunal Federal decidiu aprovar a utilização das pesquisas com células-tronco embrionárias. Foi preciso discutir até mesmo quando se inicia a vida, o conceito de alma e muitos outros temas que antes eram restritos às discussões teológicas. As cirurgias para “mudança de sexo” se multiplicam e os transexuais ganham visibilidade midiática. No caso de alguém converter-se após a referida mudança, como a igreja acolherá esta pessoa?
As catástrofes naturais
A primeira e mais chocante catástrofe ambiental deste século foi o tsunami do Continente Asiático, em dezembro de 2004. Esse desastre varreu diversos países, fazendo com que cidades inteiras sumissem instantaneamente. O número de mortes superou os 230 mil. Terremotos e outros desastres, inclusive no Brasil, demonstraram a fragilidade humana diante da fúria da natureza e suscitaram novamente a pergunta: “Por que coisas ruins acontecem se Deus é bom?”
As mudanças das leis e dos valores morais
Em um país de orientação predominantemente cristã, começamos a perceber que as leis que visam regulamentar a prostituição como atividade profissional e o “casamento homossexual” como união reconhecida pelo Estado, não pretendem outra coisa senão uma mudança na concepção dos valores morais. O proselitismo homossexual com o patrocínio do Estado já é uma realidade. O que será das novas gerações? Quais valores morais orientarão a vida das futuras famílias?
A nova religiosidade
Longe de caracterizar-se como ateísta, este século tem se mostrado extremamente propenso à religiosidade. Entretanto, um fenômeno novo já começa a despontar. Trata-se do que, momentaneamente, está sendo chamado de “movimento dos desigrejados”. A cada dia novas obras são publicadas com o depoimento de pessoas desiludidas com a igreja enquanto instituição. De acordo com o Censo do IBGE de 2010, incrivelmente, depois do catolicismo romano e da Assembleia de Deus, este é hoje o “grupo religioso” que mais cresce. É preciso pensar nas causas e em como lidar com esse novo problema.
Ascensão econômica e a melhoria na qualidade de vida
A implementação de novas políticas com a ascensão de governos que nunca haviam chegado ao poder vem causando impacto econômico positivo principalmente nas classes C e D. Entretanto, ao mesmo tempo em que produzem melhorias na qualidade de vida dos cidadãos, estes mesmos regimes introduzem políticas de minorias bastante perigosas. Até que ponto o populismo não está “dando com uma mão” para “tirar com dez outras”, fazendo com que até mesmo a moralidade seja banida?
A superexposição midiática da igreja
Desde os tempos de Constantino, em nenhum outro tempo a igreja foi tão amplamente exposta. Milagres, ou algo parecido, dividem o horário nobre da TV aberta com novelas e outras programações. Até quando a “espetacularização da fé” auxilia o verdadeiro Evangelho? Como buscar formas alternativas de evangelização sem parecer que estamos envolvidos na mesma briga mercadológica por “almas”?
A secularização mais presente
Em nenhum outro lugar o reflexo da secularização é tão evidente quanto na igreja. Apesar de serem as artes e a ciência (e a filosofia por trás delas) os grandes propulsores da modernidade tardia, no campo religioso suas influências se revelam ainda mais presentes. A flexibilização dos valores do Evangelho, visando amoldá-los às mudanças da pós-modernidade é um dos perigos mais sutis deste tempo para a igreja. O que seria, de fato, a “secularização”? A inserção de pensamentos puramente materiais na esfera religiosa ou a atribuição de uma dimensão religiosa às coisas puramente temporais?
A igreja do século 21
Recentemente, um novo conceito surgiu nos círculos teológicos brasileiros, trata-se da chamada “teologia pública”, ou seja, a mensagem cristã adequada em termos de linguagem, forma e conteúdo, às necessidades das pessoas do mundo atual. Fazer esse caminho e não secularizar o Evangelho é o grande desafio da igreja neste tempo. Se ela fechar-se, poderá tornar-se sectária, obsoleta e incomunicável às pessoas que dela mais precisam. Não obstante, abrir-se em demasia, leva a comunidade de fé ao perigo de descaracterizar-se diante das absorções indiscriminadas de modelos que não servem para a sua vivência.
Considerações Finais
Que mudanças devemos ainda enfrentar nesse novo milênio? Eis uma pergunta impossível de ser respondida. Quais implicações, os acontecimentos acima elencados, trouxeram para o dia a dia da sociedade? Esta sim é uma questão, não apenas possível de ser respondida, mas que deve obrigatoriamente ocupar a pauta das discussões, pois é para isso que nós, professores, fomos chamados.