Acompanhe conosco a incrível jornada de um grande articulista assembleiano em sua cruzada contra o ministério pastoral feminino. Eu até entendo que ele não concorde, daí a utilizar os mais absurdos argumentos, distorcer a hermenêutica dos textos e fazer uma peculiar interpretação somente para justificar sua tese é desonestidade intelectual.
O prezado pastor Ciro Sanches, conhecido comentador da CPAD, escreve hoje no blog CPADNews um artigo, na verdade com a republicação de algumas de suas ideias sobre o ministério pastoral feminino[1]. Nada tenho contra o articulista, diga-se de partida, esteve aqui em Abreu e Lima/PE, por ocasião de uma de nossas EBOs, tive a honra de conduzi-lo até o hotel onde estava hospedado com sua digníssima esposa. E tivemos uma conversa respeitosa e agradável. Creio, portanto, que não somos inimigos, mas, não vou nesse vagão. Vou esmiuçar seu artigo, como já fiz com o do Pr. Antonio Gilberto.
Por que mulheres não podem ser pastoras?
Há algum tempo, certo pastor publicou, em seu blog, um artigo “antipático”, contrário ao ministério pastoral feminino. Ao acompanhar as discussões ali e nas redes sociais, verifiquei que algumas irmãs ficaram furiosas com o seu texto. E uma delas afirmou: “As doutrinas são dos homens. Os dons vêm de Deus”. Creio que muitos irmãos (mulheres e homens) ainda não aprenderam que Deus adotou o princípio da prioridade, quando deu ao homem a incumbência de liderar a família e o ministério.
Esse princípio de fato existe para a família, para o casamento e outra série de coisas, nas quais incluiria a Igreja. Ocorre que nós, os HOMENS, fomos transferindo a prioridade. Entendeu? O princípio se divino é imutável, mas nós, os HOMENS, fomos dando nosso jeito. Exemplos: Círculo de Oração! Ora, qual o homem, de forma generalizada, que deseja orar oito horas por dia? Poucos, quase nenhum. Aí as mulheres são chamadas e não fogem da responsabilidade.
Minha mãe foi dirigente de três desses trabalhos. Chegava invariavelmente às 08:00h e retornava às 16:00h, pausa de 30 minutos para almoçar na igreja mesmo. Trabalho duro. Toda semana um dia inteiro, outro dia para oração pela manhã, de 08:00h às 11:00h e visita aos enfermos à tarde, de 14:00 às 16:00h. Ainda é feito do mesmo jeito por centenas de dirigentes que temos em cada um dos nossos templos. Detalhe: Minha mãe liderava um grupo de oitenta mulheres, mais do que muitas igrejas, não é?
Mas, espere! Visitar enfermos e orar não é trabalho para os obreiros? Sim. É o que está lá em Atos 6:4 e 20:35. E por que, gentilmente, damos a prioridade às mulheres? Tem mais…
E ensinar a crianças tenras e irrequietas? Em todo nosso ministério, só conheço um presbítero que faz isso muito bem. Em Israel era o rabino que ensinava a Torá às crianças. Por que delegamos tal tarefa às irmãs? Porque dá trabalho e exige tempo e preparo. Novamente damos toda prioridade a elas!
Mulheres podem pregar o Evangelho, orar pelos enfermos e desempenhar todas as tarefas de um seguidor de Jesus? Sim. E devem fazê-lo, pois a Grande Comissão é para todos os salvos, sem nenhuma distinção. Mas, se elas são cooperadoras de Deus, por que não poderiam ser pastoras? Como sou homem, talvez a minha resposta a essa pergunta soe como machista. Por outro lado, quando mulheres defendem pontos de vista contrários ao machismo, alguns homens ficam com a impressão de que elas são feministas. Como resolver esse difícil impasse?
Penso que aqui não haja nada ver com impasses sobre influências mundanas. Eu também repilo o machismo e o feminismo como escolas de pensamento. Porém, às mulheres se dá todas as tarefas, como depreendemos do texto, e depois lhes negamos o crachá? É esse o problema? Ou colocando de outra maneira: Enviamos uma missionária ao campo, com TODAS as prerrogativas de um obreiro do sexo masculino. Ela ministra a Palavra, constrói igrejas, batiza novos membros, ora por enfermos e, depois, quando o trabalho cresce um homem é que pode pastorear?
Nem defendo que as mulheres sejam consagradas a pastoras. Jamais levantaria tal questão numa Escola de Obreiros ou reunião ministerial. Agora usar esses argumentos para provar esta tese, simplesmente, não dá!
Sem ofensa pessoal, gostaria muito que o pastor dissesse isto às duas palestrantes que vieram ao último Congresso de EBD, ou a Stan Toler, que como presidente da Igreja do Nazareno consagra mulheres. Ou melhor, defendesse esta tese numa reunião da Assembleia de Deus americana, que consagra mulheres desde 1918. Quando ainda nem se falava em feminismo! Stanley Horton, o queridinho dos teólogos brasileiros, endossou o documento da AD americana que defendeu a consagração delas!
Por outro lado, este mesmo argumento tenta associar uma possível aceitação de mulheres no ministério pastoral como uma brecha para aceitação de homossexuais no mesmo. Deus não chama homossexuais para o ministério, pela simples razão de que ele não criou um terceiro, quarto, quinto gênero. As mulheres (pastoras, inclusive) não criaram tais distorções, foram os homens que as permitiram, como é o caso da Igreja Presbiteriana americana.
Registro aqui as sábias palavras do Pastor Josué Melo Salgado: “É preciso lembrar que a subalternação da mulher em relação ao homem não é fruto da teologia da criação, mas da teologia da queda. “E à mulher disse: Multiplicarei grandemente a dor da tua conceição; em dor darás à luz filhos; e o teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará” (Gênesis 3:16). Ao invés de fundamentarmos a nossa teologia sobre a mulher no pós-queda, deveríamos fundamentá-la no pré-queda, e afirmar o absoluto poder do Evangelho em superar as consequências danosas da queda. Foi assim que Jesus fez quando tratou da banalização do casamento; Ele insistiu, “não foi assim desde o princípio” (Mateus 19:4, 8).”.
Homens e mulheres precisam entender que, independentemente das circunstâncias, a Bíblia sempre será a inerrante e infalível Palavra de Deus.
Boa, também concordo. A inerrante Palavra de Deus proíbe o púlpito às mulheres! Vamos cumprir o que está lá ou é só para conveniência? O que fazer quando mulheres forem usadas em profecias para exortar pastores e a igreja em geral?
Mulheres e homens não devem “legislar” em causa própria, e sim respeitar o que a Palavra do Senhor assevera acerca da priorização e da hierarquização estabelecidas pelo Senhor na família e no ministério. Alguém dirá: “Deus não faz acepção de pessoas. Somos todos iguais. A Igreja não é como as forças armadas. Não existe hierarquia no meio do povo de Deus. Homens e mulheres podem ser pastores”. Quem diz que Deus não hierarquiza e prioriza deveria estudar passagens como Gênesis 1; Números 2; Atos 15.6,22; 1 Coríntios 12.28,29; 15.23; 1 Tessalonicenses 4.16,17; 5.23, etc. Observe especialmente os termos “primeiramente”, “em segundo lugar”, “em terceiro lugar”, “depois”, etc.
Mas o que pastores HOMENS vêm fazendo por décadas a fio, senão legislar em causa própria, definindo os papéis mais adequados às mulheres e fugindo, nesta adequação, dos mais pesados e desgastantes? As mulheres são mais jeitosas com o Círculo de Oração Infantil… Onde está escrito isso? A hierarquia é necessária, senão vira bagunça, mas a Bíblia nos passa rasteira quando a usamos para nossa conveniência.
Em Isaías 43.7 está escrito: “a todos os que são chamados pelo meu nome, e os que criei para minha glória; eu os formei, sim, eu os fiz”. O ser humano não foi apenas criado por Deus. Ele foi criado, formado e feito para a glória do Senhor. Um edifício, antes de ser formado e feito, é criado pelo arquiteto, que faz, antes da construção, o croquis, o projeto, etc. Formar é dar forma ao que foi previamente criado, concebido, projetado. A feitura, mencionada no texto bíblico, diz respeito ao acabamento da obra (cf. Gn 2.3). Quem foi criado primeiro, o homem ou a mulher? Nenhum dos dois, pois ambos fizeram parte do projeto original de Deus. Na criação não houve priorização: “macho e fêmea os criou” (Gn 1.26). Quem foi formado primeiro? O homem. Segue-se que a priorização divina ocorreu na formação, e não na criação: “Porque primeiro foi formado Adão, depois Eva” (1 Tm 2.13).
Por que o Senhor não formou primeiro a mulher e, depois, tomou uma das costelas dela para formar o homem? Porque Ele é soberano e decidiu priorizar o homem (Gn 2.7,22). No cristianismo genuíno não há espaço para machismo e feminismo, movimentos extremados que ignoram o princípio divino da prioridade. O primeiro adota o princípio da superioridade e considera a mulher inferior ao homem, enquanto o outro, adotando o mesmo princípio, demoniza o homem. No Corpo de Cristo, há lugar para ambos os sexos, desde que reconheçam, à luz das Escrituras, a sua posição.
Reconheço que muitos homens cristãos precisam reconsiderar a sua opinião acerca das mulheres, que, ao longo dos séculos, vêm sendo discriminadas, principalmente no meio religioso. Por que muitas irmãs em Cristo não aceitam a doutrina de Deus (e não de homens) quanto à submissão ao marido? Porque muitos esposos, autoritários, se consideram superiores às suas esposas e as desprezam. Segundo a Bíblia, a relação entre homem e mulher deve ser, antes de tudo, de respeito mútuo (1 Co 7.3-5). Deus formou Eva a partir de uma das costelas de Adão (Gn 2.18-22) para demonstrar que a mulher não deve estar nem à frente nem atrás do homem, mas ao seu lado e de frente para ele, como adjutora e ajudadora, o que não denota inferioridade. Observe que Deus, infinitamente superior ao ser humano, é o nosso Ajudador (Hb 13.5,6).
Paulo compara a submissão da mulher à sujeição de Jesus (1 Co 11.3). Deus Filho e Deus Pai fazem parte da Trindade e são iguais em poder (Mt 28.19; Jo 10.30). Todavia, Cristo, por amor, e não por imposição do Pai, submete-se voluntariamente a Ele, recebendo dEle toda a honra (Fp 2.6-11). A Palavra do Senhor também afirma: “assim como a igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres sejam em tudo sujeitas a seus maridos” (Ef 5.24). E Cristo não obriga ninguém a obedecê-lo.
Nestes termos concordo. Apesar de perceber que na verdade o articulista quer embasar sua infeliz argumentação logo adiante.
A Bíblia não abona o igualitarismo feminista, mas também não avaliza o machismo. O termo “vaso mais fraco” (1 Pe 3.7) não foi empregado como sinônimo de inferioridade. Ele denota que a mulher é mais frágil, mais sensível e, por isso, deve ser amada e honrada pelo marido (Ef 5.25-29). Repito: o princípio que Deus adotou foi o da prioridade, e não o da superioridade, visto que Ele não faz acepção de pessoas (At 10.34). E o princípio da prioridade também vale para o exercício do ministério. Quem não aceita o princípio bíblico da prioridade abraçará, inevitavelmente, “doutrinas de homens”, como o igualitarismo feminista. Alguns teólogos, ao não encontrarem nas Escrituras passagens claras em defesa do ministério feminino, têm afirmado que Paulo era contrário às mulheres, em razão de sua formação farisaica. Isso não resiste a uma exegese, pois nenhum machista aconselharia os homens a amarem a sua própria mulher (Ef 5.25), tampouco teria tantas mulheres como cooperadoras (Rm 16). Ademais, esse apóstolo se declarou imitador de Cristo (1 Co 11.1).
O rabino dizia ao amanhecer: Dou-te graças, ó Deus, porque não me fizeste gentio, escravo ou mulher. Por outro lado, ensinar a Lei a uma mulher era perda de tempo, dizias os rabinos. Era esse o contexto teológico no qual Paulo foi criado e cresceu. E sabe por que ele mudou radicalmente sua visão? Um episódio entre outros foi decisivo: a descida do Espírito Santo no Cenáculo! A imagem que se desfez, como um espelho estilhaçado, é de que no templo mulheres e homens não podiam adorar juntos.
Se Paulo era machista, o que dizer de Jesus, que escolheu doze homens para compor o ministério da igreja nascente? Ele teria se enganado? Ou o Mestre tinha algum vínculo com fariseus, saduceus ou quaisquer grupos machistas de sua época? A Bíblia diz claramente que o Senhor “chamou para si os que ele quis” (Mc 3.13). Por que Ele não quis chamar algumas mulheres para figurar entre os seus apóstolos? Por que não chamou seis casais, por exemplo? Na escolha dos primeiros diáconos, que poderiam vir a ser presbíteros ou apóstolos, caso tivessem chamada de Deus para tal e servissem bem ao ministério (Hb 5.4; 1 Tm 3.13), os apóstolos disseram: “Escolhei, pois, irmãos, dentre vós, sete varões” (At 6.3). No primeiro concílio, em 52 d.C., os rumos da igreja foram traçados por homens (At 15).
Ok. Então, se vamos cumprir a Bíblia e seguir o pressuposto jamais mulheres devem ser convidadas para traçar quaisquer estratégias na Igreja. De festas, eventos, recepções, aniversários, organizações e tudo o mais. Dá pra ser assim? Claro que não. Hoje elas estão em toda parte. Tente, um pastor homem, fazer um Dia das Mães sem confabular com elas!? Então, a conclusão é que, como se diz aqui, essa boiada já passou!
Em Apocalipse 2 e 3, são mencionados os pastores (homens) das igrejas da Ásia. Alguns teólogos dizem que Júnias (ou Júnia) era uma apóstola. Mas, pelo que tudo indica, ele (e não ela) era apenas um cooperador de Paulo. Mesmo que Júnias fosse uma mulher, o texto bíblico não confirma o seu apostolado, pois não era comum uma mulher ficar presa com homens: “Saudai a Andrônico e a Júnia, meus parentes e meus companheiros na prisão, os quais se distinguiram entre os apóstolos e que foram antes de mim em Cristo” (Rm 16.7). Distinguir-se entre os apóstolos não significa, necessariamente, exercer o apostolado. Marcos e Lucas, por exemplo, não eram apóstolos e se distinguiram, se notabilizaram, entre eles. Nos tempos da igreja primitiva, as mulheres se ocupavam da oração (At 1.14) e do serviço assistencial (At 9.36-42; Rm 16.1,2). E algumas se notabilizaram como fiéis cooperadoras do apóstolo Paulo, como Febe, Priscila, Trifena, Trifosa, etc. (Rm 16), além de Lídia, a vendedora de púrpura (At 16.14). Não há nenhuma referência a mulheres exercendo atividades pastorais.
Sobre Júnias evoco a citação do documento da AD americana[2] que apoia o ministério feminino: Junia was identified by Paul as an apostle (Romans 16:7). Beginning in the thirteenth century, a number of scholars and translators masculinized her name to Junias, apparently unwilling to admit that there was a female apostle. However, the name Junia is found more than 250 times in Rome alone, while the masculine form Junias is unknown in any Greco-Roman source. Paul clearly was a strong advocate of women in ministry.
Por que não mencionar synergos, para cooperadores, Áquila e Priscila, em Rm 16:2? Lembrando que synergos remete-nos à imagem de dois remadores num mesmo barco. O que dizer de kopiaô, no mesmo capítulo 16 de Romanos? É o verbo que Paulo usa para o trabalho de Maria (v. 6), Trifena, Trifosa (v. 12), o mesmo utilizado em I Co 4:12, 15:10, 16:16, este último é salutar para compreender a implicação do termo, entre suas 22 ocorrências.
Alguns defensores do pastorado feminino afirmam que Priscila era uma apóstola, mas, a despeito de ela ter sido citada com destaque (At 18.26), não há nenhuma referência que confirme seu apostolado. “E as mulheres que estão no campo missionário dando a sua vida pela obra de Deus? Não podem elas exercer o pastorado?”, alguém perguntará. É claro que as regras têm as suas exceções. Mas não devemos nos valer destas para adotar condutas generalizantes, sem compromisso com as Escrituras, como o pensamento infundado de que todas as esposas ou filhos de pastores são automaticamente pastores.
Vejo que quando nos é conveniente podemos quebrar as regras? Não tem homem com coragem suficiente de ir aos campos brancos, então se envia uma mulher! Essa é a dolorosa realidade. Quando o trabalho crescer, até para dar satisfação à membresia, vai um homem para o lugar dela.
Também concordo que filhos e esposas não sejam automaticamente pastores, mas é a prática, se não escrita, em voga no Brasil, especialmente em nossa amada Assembleia de Deus. Conheço insuspeitas senhoras esposas de pastores que influem até em consagrações ministeriais!
Conquanto as mulheres sejam mencionadas com grande destaque nas páginas do Novo Testamento, aparecendo na linhagem e no ministério de Cristo (Mt 1.3,5,6,16; Lc 8.1-3), Deus priorizou os homens, em regra geral, no que tange ao pastorado e aos ministérios afins (Ef 4.8-11). Mas isso não significa que as mulheres não podem trabalhar para Deus. Todos os salvos, sem distinção, são cooperadores de Deus (1 Co 3.9). E precisamos aceitar a chamada soberana do Senhor para a nossa vida. Não devemos amoldar a Bíblia ao nosso modo de pensar nem às influências filosóficas prevalecentes no mundo. Por mais que nos sintamos contrariados, devemos renunciar o nosso eu (Lc 9.23), a fim de obedecermos à vontade de Deus, que é boa, agradável e perfeita (Rm 12.1,2).
A própria Igreja tem dado destaque às mulheres e as preparado para o exercício impensável de ministérios nas congregações. O que dizer da enorme quantidade de irmãs nos seminários teológicos? Nos cursos de pós-graduação teológica e nos mestrados? Para aprimorar o crochê, trocar receitas culinárias? Certamente que não. A música, a adoração e o ensino na EBDs da Igreja são predominantemente femininos. Dias atrás recebemos duas pastoras americanas que ministraram maravilhosamente para pastores e líderes no Congresso de EBD. Façam um levantamento do público ensinador, se não era majoritariamente feminino.
Tivemos uma Frida, pregadora, compositora, evangelista e pastora. Só não tinha crachá. Aí é outra história…
[1] http://cirozibordi.blogspot.com.br/2011/12/por-que-deus-prioriza-o-homem-na.html
[2] Documento da AD americana aqui