Fui à pré-estreia do filme “A Cabana”, homônimo do livro que havia lido faz algum tempo. Logo após sair do cinema um amigo que assistiu comigo postou algo sobre o filme em tom elogioso e, de imediato, recebeu reprimendas e alertas de alguns de seus milhares de seguidores no Facebook.
Para mim não foi novidade. Quando o livro saiu, alguns anos atrás, tive que explicar para um monte de pais e mães de minha igreja do que se tratava a obra e porque havia tantos comentários na internet se opondo ao conteúdo do livro supostamente herege.
Sinceramente, ainda me impressiona quando cristãos ficam assustados com conteúdos editoriais desse tipo que são simples estórias e ao mesmo tempo se apavoram com a possibilidade de danos que podem advir de um conteúdo ficcional que fale sobre Deus, Jesus, o Espírito Santo, ou a Trindade.
Deus não precisa de defensores em alerta máximo nas redes sociais, para protegê-lo de ataques hereges que tentam de alguma forma afetar sua imagem e tudo aquilo que os seus acreditam, deixando-o com baixa popularidade. Ou mesmo que “arranhem” sua imagem e atrapalhem o processo de evangelização – se é que ainda nos preocupamos exatamente com isso hoje em dia.
Confesso que também me pergunto se as críticas ao autor da obra (não o conheço pessoalmente e nem tenho contrato ou procuração para defendê-lo) não seriam de fato o resultado de preconceitos? Afinal, o personagem que se refere a Deus é apresentado ali como mulher e negra. O Espírito Santo é uma mulher descendente de asiáticos. E Jesus é um homem comum, frágil e sensível.
O livro “A cabana” é primeiramente uma ficção e não um ensaio, tão pouco uma tese ou história de uma realidade factual. E também não é uma obra de Teologia. É simplesmente uma estória! E, de fato, é uma estória que sinaliza em alguns belos momentos a soberania e a grandeza de Deus, que se fez homem como nós, e que procura mostrar certa leveza em relação a uma Trindade que não conseguimos compreender; afinal, 1+1+1=3 ou 1+1+1=1?
O autor procura desenvolver a estória a partir de alguns elementos muito caros e provocativos ao ser humano moderno. Principalmente aos que se dizem cristãos: dor, sofrimento, maldade, injustiça, perda, pais e filhos, família, criança, um breve momento e tudo pode acontecer a qualquer um de nós. E isso nos toca e apavora a todos, já que queremos ter sempre o controle da vida e da morte em nossas mãos. Mas esses temas já eram de difícil compreensão até mesmo para os antigos personagens bíblicos, incluindo Jó, Davi e os discípulos (Jó 42; Sl 37; João 9).
O filme me fez lembrar de como não entendemos os mistérios de Deus, apesar de tentarmos e de alguns nos prometerem que isso é possível (Rm 11.33-34a). Ao mesmo tempo, me fez lembrar o alto preço que foi pago por Jesus para se tornar como nós, sendo confundido, desvalorizado e injustiçado até a morte mais vergonhosa de sua época – que grande e impressionante amor!
Não é raro perceber hoje nas igrejas cristãs heresias mais perigosas, disseminadas com a seriedade de quem produz teologia, e não ficção. É verdade que são teologias ficciosas, que tentam desviar os cristãos da verdadeira doutrina (2Tm 4.3-4). E há também péssimos testemunhos chegando a todos pela TV ou internet, com práticas e conteúdos muito mais escandalosos do que o livro “A cabana” apresenta, principalmente no que se refere a dinheiro, sexo e poder – essa trilogia do mal, que ultimamente tem envolvido os políticos e poderosos do nosso país, nos dando a sensação de profunda desesperança. E é contra isso que devemos nos posicionar! Isso é realidade e história, e não ficção e estória.
É claro que todos têm o direito de discordar da forma, do conteúdo e dos símbolos religiosos como são utilizados em “A cabana”, assim como em outras obras que tentar abarcar a temática religiosa, principalmente os personagens mais sagrados e caros para a grande maioria dos cristãos. Lembremos de “O código Da Vinci” que questionava a divindade de Jesus e, ao mesmo tempo, falava de supostos sentimentos pouco divinos, ou humanos demais, sobre Maria Madalena.
Devemos ser menos alarmistas e abandonarmos a mania de sermos os “Patrulheiros da fé”, principalmente com a internet e as mídias sociais que são hoje tamanha ferramenta para instigar a agressividade e violência entre pessoas, ainda que religiosas, ou principalmente entre elas.
• Marcos Simas é casado com Alzeli e pai de Pedro e Clara. Trabalha como editor, tendo publicado mais de 400 obras ao longo de mais de 25 anos.
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