Será que o imbróglio Lula pode trazer lições para a Igreja? O que podemos aprender com o escândalo do PT? A Igreja está a salvo de cair nas mesmas tentações do PT? Ou, na verdade, está nadando na mesma lama?Podemos refletir a respeito com muita atenção à História recente de nosso País? Vem comigo!
Prezados, quarenta leitores, estou meio ocupado, correndo aqui e ali. Mas já há alguns dias me inquieta a similitude entre a história do PT e seu líder máximo e a Igreja brasileira. De saída um observador mais arguto dirá: Ora, ora, a Igreja tem dois mil anos! Só em solo brasileiro 516! Mas gostaria de lembrar que a História é cíclica e nosso foco é a igreja evangélica autóctone ou desenvolvida em nossa Pátria. Karl Marx, em seu Dezoito Brumário de Louis Bonaparte, já dizia: “A história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”. Vamos em frente? Ficou meio extenso, mas hoje é domingo…
Não podemos iniciar este breve artigo sem relembrar a história do PT. O partido iniciou-se com a abertura política promovida pelos governos militares. Corria o ano de 1980 quando seu líder máximo, Lula, junto a outros líderes sindicais e intelectuais o fundaram. Em 1982 o partido foi reconhecido e pode atuar, primeiro participando de eleições municipais, especialmente, nas cidades do ABC, onde o sindicalismo atuava fortemente, depois nas eleições estaduais e federais.
A primeira semelhança com nossas igrejas evangélicas é sua origem humilde, em busca de favorecer os mais pobres e necessitados. Assim como a imponência de nossos modernos templos e a riqueza de muitos pastores contrasta com a humildade dos primeiros, a riqueza da liderança petista contrasta com os dias difíceis de sua fundação. A grande lição aqui é que uma boa causa nem sempre leva a um fim humilde. Quem não lembra a dificuldade dos primeiros pioneiros assembleianos? Somente quem não conhece a história! Eram dias difíceis e desafiadores, depois veio a bonança e a concentração de riqueza. Hoje pastores já aparecem em rankings de revistas de celebridades e ainda outros exibem seus bens como sinal de prosperidade financeira. E isso é apenas a riqueza declarada…
Indo em frente, o PT participou de todas as campanhas políticas nacionais e perdeu muitas. Até que, em 2002, Lula ganhou para José Serra e o resto é História. Com esta eleição, e até um pouco antes, veio outra grande lição para a Igreja: Não é a detenção de um mandato que transforma as pessoas em virtuosas. O PT se uniu às forças mais reprováveis de nossa política e, desde então, foi piorando sua ação transformadora. À igreja evangélica já ocorreu que podia transformar o Brasil a partir da eleição de políticos evangélicos. A obra Os votos de Deus, de Joanildo Burity e Maria das Dores, Editora Massagana, tenta esboçar como se deu este projeto a partir da Igreja Universal do Reino de Deus. Ao qual se seguiram todas as outras denominações.
Quase que no mesmo período da ascensão petista, dos anos 80 até o presente, se intensificou a participação evangélica no cenário político. Mas as notícias são as piores possíveis. Quase nenhum político evangélico conseguiu ser sal e luz. Assim como os petistas, houve uma simbiose entre o interesse e o poder, além do dinheiro que vem como efeito. E o noticiário está repleto de manchetes deploráveis contra nós. Quando não é isso que acontece, nossos representantes focam apenas em questões morais. Desconheço qualquer projeto proposto por um deputado federal evangélico para reforma tributária, direitos humanos (em seu significado dicionarizado), promoção do desenvolvimento sustentável, meio ambiente e assemelhados.
Antes de prosseguir, duas notas à margem: 1) Enquanto a participação política evangélica se aprofundava as igrejas cresciam, enriqueciam e se empoderavam; 2) O crescimento da representação política eclesiástica não trouxe diminuição da alienação política da membresia. Hoje, ainda há membros de nível superior que votam no candidato que cita como norte Salmos 33:12: “Bem-aventurada é a nação cujo Deus é o Senhor”, sempre omitindo a segunda parte do versículo: “e o povo ao qual escolheu para sua herança”. Por óbvio o versículo se refere a Israel! Outros que votam no deputado que mais traz cantores ao Estado ou que promove mais cruzadas. Cruzada é projeto de deputado ou de igreja!?
A terceira lição vem do patrimonialismo petista. Ora, seus líderes tratam o Estado brasileiro como extensão de sua liderança, seus sindicatos, seu raio de atuação. O mensalão e o petrolão são ecos da tentativa de privatizar o Estado para si. Quantas lideranças evangélicas não pensam o mesmo? Não duvide de pastores que acham que a Igreja lhe deve uma recompensa. É um sentimento errado e sincero, ele está expressando uma certeza! Muitos acham que seu trabalho, sua reputação, pasmem!, é motivo suficiente para reivindicar algum benefício em prol de si mesmos ou seus familiares. De modo que o favorecimento ao líder ou aos parentes e apaniguados é visto como um ato generoso ao projeto do partido ou da igreja.
Dia desses um amigo me contou a seguinte história de uma de nossas grandes Convenções assembleianas: O filho do presidente foi ao tesoureiro e pediu alguns milhares de reais, sem nota fiscal, sem nenhum documento. Assinou o recibo e foi embora. Dias depois vem a reunião do Conselho Fiscal e o presidente estranha uma quantia tão alta na rubrica de saídas. O tesoureiro argumenta: “Foi seu filho!”. O presidente retruca: “Ah! Tá!”. E ficou por isso mesmo. Ainda que fosse troco de pão a obrigação seria justificar o gasto/investimento. Mas a preponderância do líder e o fato de regiamente remunerar a oligarquia ao seu redor neutraliza o questionamento. Foi assim que a cúpula de uma das médias igrejas evangélicas brasileiras foi parar na cadeia e alguns ainda estão mofando lá[1].
A quarta lição vem do estilo centralizador de Lula. Apesar da premissa petista de que há eleições para todos os cargos dentro do partido, a decisão em última instância, para os cargos mais importantes, cabe a Lula. Foi assim que o PT pernambucano, por exemplo, teve que “engulir” Armando Monteiro, um empresário do PTB, para a eleição majoritária neste Estado. Todos evitam contestar o líder, enquanto a instituição afunda. O brilhante economista norte-americano Canice Prendergast lançou, em 1993, um artigo intitulado A Theory of Yes Men. É um estudo sobre a importância da discordância numa organização. A discussão básica do livro se dá em torno do diagrama abaixo:
Em todas organizações as pessoas dizem sim com medo de perder seu emprego, seu cargo, sua posição hierárquica, amizades, networking. Por vezes, é exatamente sim o que querem ouvir gerentes e líderes. É o que lhes infla o ego e os faz pensar que estão no rumo certo. Mas esta tendência tem se mostrado danosa para a estratégia organizacional. Um líder eficaz compreende que é humano e suas decisões são limitadas. Ouvindo não ele será obrigado a repensar suas escolhas e evitar erros mais rapidamente do que aqueles que só aceitam submissão. Agora o PT está às voltas com suas decisões equivocadas e ninguém se atreverá a salvá-los.
Conheço excelentes pastores de todo o Brasil. Muitos, porém, com seu estilo centralizador afastam bons colaboradores e se põem a girar em círculos. Quem discorda, mesmo que respeitosamente, é taxado como irresponsável, provocador, semeador de contendas. Isso pra dizer o básico. Porque não raro é associado ao próprio Diabo. Quem nunca ouviu de alguém que foi comparado a Datã, Coré e Abirão, os famosos dissidentes do povo de Israel? As pessoas não compreendem que pastores e líderes podem falhar, mesmo sendo escolhidos por Deus e tendo a melhor intenção possível. Somente alguns milhares de reais jogados no lixo ou pessoas chateadas adiante é que se percebe que o alerta de outrora era pertinente. É claro que do líder se exige tirocínio e visão estratégica, mas isso não impede ouvir a opinião alheia para formar melhor juízo.
A quinta lição é a da intocabilidade de Lula. Mesmo em meio a graves denúncias, com fartos rastros e até provas, a liderança petista crê em sua inocência. É um caso crônico de cegueira, mas não de todo alheio à realidade dos partidos em geral. Não custa lembrar, porém, que o PT sempre se colocou como diferente de tudo que está aí, só no poder é que pode provar que era mais do mesmo. Um grande líder evangélico disse que “o partido passou 20 anos discutindo ética em assembleias. Quando saiu às ruas e alcançou o poder, se prostituiu”. Em organizações sérias Lula seria suspenso ou licenciado até que tudo estivesse provado. Não é diferente em muitas igrejas, pilhado em algum desvio os líderes esperneiam, renegam, acusam, desviam o foco, se fazem de vítima, tornam-se coitados. E enquanto a trama se desenrola vão queimando os fusíveis menores até não sobrar nada. Nem a intocabilidade!
A sexta e última é a constante utilização de terceiros para fazer o serviço sujo. Um serviçal desajeitado, um outro subserviente, ainda outro devedor de favores. É o churrasqueiro, um ajudante de ordens, o secretário, um ministro. É sempre assim ao redor da nata petista. Assessores pilhados com cuecas de dinheiro submergem nas sombras para despistar o mandante e vai por aí. Alguns são especialistas em produzir dossiês que incriminem um desafeto. A maioria tem ficha suja e é incompetente e bajulador. Não é diferente na Igreja. Tarefas sórdidas, como abafar um caso extraconjugal de um líder, são delegadas a subalternos mequetrefes. A outro propor coisas de fazer corar em assembleias e reuniões, como altos salários e benesses. Alguns deles se encarregam de fazer pontes com o próprio poder público para, em nome do superior, sabendo ele ou não, auferir alguma vantagem. Dia desses chegou ao meu conhecimento que um auxiliar menor, que havia sido candidato a vereador, estava achacando um prefeito em nome do seu pastor. Um secretário ligou para outro pastor amigo, que cobrou o pastor daquele auxiliar para saber a verdade. Em meio ao disse que não disse, a realidade é que havia uma troca de favores e dinheiro entre os envolvidos. Coisa vergonhosa de ser ver, mas perfeitamente possível quando houve o casamento da política secular com as igrejas evangélicas. Tudo feito através de terceiros.
Poderíamos ainda falar de pragmatismo, amor ao dinheiro, que é a raiz de tantos males, falsos discursos. dois pesos e duas medidas, o “eu não sabia” sabendo de tudo, a personalização administrativa e tantas outras coisas. Continuem sua reflexão!